Atropelamento de animais.- o lado social e econômico
Estamos no final de março de 2022, começo da noite em um trecho de rodovia sob concessão no Mato Grosso do Sul (BR 163). Lucas (nome fictício) retornava com outras três pessoas para Coxim, a uns 250 quilômetros de Campo Grande.
A rodovia escura, de pista simples, muito trânsito e uma anta.
Uma anta???
Sim, o maior vertebrado brasileiro, ameaçado de extinção, cruzou a pista na frente do fiat de Lucas. Apesar de não existirem informações do tamanho deste indivíduo, a espécie pode pesar mais de 300kg.
Agora imagine, um animal deste porte sobre a rodovia onde o carro normalmente está a 100km/h. Não sabemos nada sobre a reação de Lucas ao avistar o animal, mas a física mostra que o impacto do atropelamento pode representar uma pressão superior a 6.000kg aos ocupantes do veículo.
O resultado desta fatalidade…. 4 pessoas mortas e outras feridas em veículos que cruzaram com a anta já atropelada sobre a rodovia.
Qual a probabilidade de você estar trafegando em uma rodovia e um animal selvagem cruzar na sua frente?
Puxa, sempre quis ver uma anta na natureza, ou um tamanduá, ou uma onça, e quando isso acontece é sobre uma rodovia, causando uma tragédia. E digamos a verdade, uma tragédia social e ambiental.
O custo de um acidente com animais na sua concessão!
O custo de um acidente com animais na sua concessão!
Estudo realizado para o estado de São Paulo estimou um custo superior a US$ 25 milhões, o que representa R$ 138 milhões (Abra et al., 2018). Considerando os custos por acidente, em reais, é de R$ 52.800,00. O mesmo trabalho mostra que 91,7% das ações judiciais resultam em ganho para os usuários e responsabilizam o administrador da rodovia.
Quantos acidentes com animais acontecem por ano em uma concessão? Se forem 10, estamos falando de meio milhão de reais em custos jurídicos. Entretanto sabemos que os números são bem maiores e tendem a crescer com o aumento da percepção da culpabilidade dos administradores. Assim, as ações judiciais aumentarão ano a ano.
Entretanto, as consequências para a marca podem ser ainda mais danosas para a empresa. Hoje, a busca por investidores, presença em bolsa, certificações ambientais, ESG e muitos outros indicadores estão diretamente vinculados à força da marca e a demonstração inequívoca da sua busca pela união do desenvolvimento social e econômico atrelado à conservação ambiental.
Dados oficiais de atropelamento no Brasil
Dados oficiais de atropelamento no Brasil
Não se engane, dados da Polícia Rodoviária Federal (PRF) do ano de 2017 mostram que 2% de todos os acidentes que ocorreram no Brasil são em decorrência de atropelamento de animais. Parece pouco? São 11.124 acidentes em um único ano.
Estes números não diferenciam animais domésticos ou selvagens, mas mostram que o Lucas, os três passageiros e mais 310 pessoas morreram devido este tipo de acidente. Outras 1027 pessoas sofreram lesões graves e 3604 tiveram lesões leves.
Os dados da PRF são coerentes com o que conhecemos de atropelamento de animais silvestres. As duas rodovias com maior número de acidentes são as BRs 101 (1079 atrop.) e 116 (1053 atrop.). O que seria de se esperar pela extensão, já que cortam o Brasil de norte a sul. Já a terceira rodovia com maior número de ocorrências é a BR 262, no Mato Grosso do Sul.
Só quem já viajou por essa estrada pode entender a carnificina que ocorre ali. E ela é muito visual e perigosa devido existirem muitos animais de grande porte como a anta, tamanduá-bandeira, capivaras, entre outros. Pelos dados da PRF foram 803 atropelamentos.
Se você quer ver dados científicos sobre essa rodovia, clique aqui e faça o download do artigo que sou co-autor e que mostra números alarmantes da mortalidade de animais selvagens.
Ainda sobre os dados da PRF, dos 11.124 atropelamentos, 1012 causaram capotamento de veículo, 64 causaram incêndio e 262 provocaram a queda de ocupantes para fora do veículo.
Os custos de um atropelamento no Brasil
Os custos de um atropelamento no Brasil
Além das questões sentimentais, ou danos psicológicos à família e ao acidentado, temos de considerar os custos financeiros para a sociedade brasileira.
Dados do Instituto de Pesquisas Econômicas e Aplicadas (IPEA) e da PRF, baseados em valores de 2014, mostram que cada morte nas estradas, representa R$ 646.792,94 para a sociedade brasileira. Se multiplicarmos esse valor pelos 314 registros de mortes devido os atropelamentos de animais, temos R$ 203.092.983,16 no ano de 2017.
Se somarmos os valores calculados para acidentes com vítimas (sem fatalidades) e danos materiais, o valor será de R$ 763.222.387,00 no ano de 2017.
Corrigindo os dados oficiais
Corrigindo os dados oficiais
Agora aqui cabe uma reflexão rápida. Esses danos certamente são aqueles mais graves, onde foram produzidos boletins de ocorrência e entraram nas estatísticas oficiais.
Você nunca atropelou um animal, doméstico ou selvagem, estragou seu carro, teve um grande susto, mas seguiu viagem?
Os números da estimativa anual de atropelamentos de animais selvagens mostra que podem haver quase 45 milhões de atropelamentos de animais de médio e grande porte por ano.
Ou seja, se considerarmos um valor igual a 1% do menor valor informado pelo IPEA (R$ 230,60), teremos um dano de R$ 10.377.000.000,00 por ano devido atropelamento de animais. O mais incrível é que, se houvesse um investimento de 0,1% deste valor em pesquisa científica, teríamos resultados que reduziriam drasticamente estes acidentes.